Término de relacionamento. Escrever e pensar sobre isso me faz lembrar de um poema que muito angustia:
quanto falta pra gente se ver hoje
quanto falta pra gente se ver logo
quanto falta pra gente se ver todo dia
quanto falta pra gente se ver pra sempre
quanto falta pra gente se ver dia sim dia não
quanto falta pra gente se ver às vezes
quanto falta pra gente se ver cada vez menos
quanto falta pra gente não querer se ver
quanto falta pra gente não querer se ver nunca mais
quanto falta pra gente se ver e fingir que não se viu
quanto falta pra gente se ver e não se reconhecer
quanto falta pra gente se ver e nem lembrar que um dia se conheceu.
(Romance em doze linhas, poema de Bruna Beber)
O fim. Nele sempre há, ao menos, duas coisas contidas: agonia e poesia.
Agonia que anuncia o fim de alguém em nossa vida. O fim da vida que conhecíamos até então.
Poesia na expressão do encontro com o novo, consigo e com outros.
Dos clichês que nos servem, lembre-se “fim é sempre o começo de algo”. E é mesmo. O fim se faz presente corriqueiramente na vida de quem procura começar com alguém. Só é preciso saber lidar com o que foi e o que vem.
Não é a toa que existe tanta produção cinematográfica, música e poesia sobre término. A grande questão da vida de – quase – todas as pessoas que conheço são os finais. A grande questão da minha própria vida, inclusive, frequentemente é essa. Até porque, términos demarcam nossa história, mesmo quando o término não é propriamente nosso. Sempre existe alguém terminando alguma coisa. E tanto quanto fui aconselhada em meus finais, também aconselhei e sofri junto de términos que não eram meus. Vi e vivi muitos finais de relacionamento de amigos, familiares, conhecidos…
Foram tantos finais à essa altura da vida, e mesmo que já tenha estratégias definidas de enfrentamento do final, ele sempre dói… Até quando a dor vem em forma de alívio pelo término. Ter isso claro em nossa mente pode ajudar a saber como enfrentar a dor, pois ela é certa. A pergunta que deve ser respondida então é: você sabe identificar por que dói?
As dores do término de relacionamento: o que elas nos ensinam
O Conselho Nacional de Secretários de Saúde[1] adverte: o fim dói mesmo. Existe até um nome para isso, a síndrome do coração partido. A dor de um, pode, inclusive, provocar sintomas físicos (dificuldade para respirar, aperto no peito, perda de apetite). Isso nos ensina uma coisa.
É preciso deixar doer.
Assim como não se apressa a cicatrização de qualquer ferida exposta, não é possível curar a dor interna sem passar pelo processo de recuperação desta. Uma frase do filósofo Jean Paul-Sartre, cabe aqui para refletirmos mais sobre:
“Não importa o que fizeram com você. O que importa é o que você faz com aquilo que fizeram com você”.
Se a dor do término precisa ser vivida, precisamos entender como fazer desse período de cicatrização interna, um momento de encontro, com o início, com o novo. O novo não precisa envolver outro alguém, além de você mesmo. Até porque, quando saímos de uma relação, parece que foi muito da gente com ela também. Ou seja, é essencial, que nesse momento, a gente se reencontre e se reconecte com aquilo que éramos antes da relação, antes daquela pessoa, e o que somos agora, no depois. Voltar o olhar de desejo, de paixão, de vontade, para nós mesmos, e não mais redirecionando todos esses sentimentos para o outro.
É preciso aprender a se bastar. Descobrir o corpo novamente, testar muito cabelo diferente, descobrir novos gostos, músicas, filmes… Mas o mais importante: não se atordoar com o que antes foi compartilhado com outra pessoa. Se dói ouvir aquela canção que faz lembrar, por que assumir a posição de autoflagelo?! Se dói ver o outro postando a vida nova em rede social, por que continuar sendo telespectador? Por que continuar fazendo do outro local de refúgio?
O que resta agora são memórias, e é bom tê-las conosco. Tudo aquilo que foi, faz parte do que a gente é e das possibilidades que temos à frente. Lembrá-las com carinho é justo, mas não se prenda a elas para prosseguir. É importante abraçar a dor, mas não faça desse um lugar para se estar.
Daquilo que me serviu, nos meus últimos finais, e que eu não havia considerado em outros, é o exercício físico. E aqui serve qualquer um, desde que o corpo seja colocado em movimento. Não é conselho, é ciência. O exercício físico produz um aumento significativo de serotonina, um neurotransmissor que atua na regulação de humor, etc. Corra, caminhe, dance. A gente costuma se esquecer dentro das relações, costuma se enxergar sempre ao lado de um outro. Colocar-se em movimento é também sobre relembrar quem é você, sozinho, uno, dono de um corpo e nunca de dois. Movimentar-se nos coloca em posição de deslocamento perante nossa própria vida, acredite.
Um outro clichê que nos ajuda aqui: foque em você. Não daquele jeitinho coach/desespero. Já sentiu o que precisava ser sentido? Lembre-se, talvez o sentimento de amor nunca deixe de existir, mas relações são construções diárias, então, não recorra aquele velho erro de pensar que “se ainda existe amor, pode dar certo”. Sim, talvez muita coisa poderia ter sido diferente, mas nenhuma união acaba de um dia para o outro. Términos também são construções, são movimentos internos que nos fazem entender o que não funciona mais.
O processo de um término demora a chegar no final também. Tem quem demore muito tempo para conseguir sair de uma relação, mesmo já sentindo que não fazia bem, que já havia terminado. Pense sobre isso.
Vocês ainda continuam sendo as mesmas pessoas, acertando e errando do mesmo modo. Não se apegue ao conforto de uma relação. Aceite a sensação angustiante de não saber o que vem agora, com a certeza de que há muito por vir. Relembre os motivos que encaminharam a relação para o fim.
Mesmo quando não somos nós quem buscamos pelo término, de algum modo, estamos envolvidos no final.
O que terminou foi seu relacionamento, não termine junto com ele.
[1] https://www.conass.org.br/sindrome-do-coracao-partido-quando-a-dor-emocional-causa-sintomas-semelhantes-aos-do-infarto/