Tendinopatia do glúteo – Inflamação do Glúteo Médio e Mínimo

Tendinopatia do gluteo medio e gluteo minimo

Atualmente, a tendinopatia glútea é considerada a causa primária de dor lateral no quadril, ou síndrome da dor trocantérica maior.

Por muito tempo, dores laterais no quadril foram diagnosticadas como bursite trocantérica, mas esse diagnóstico passou a ser confrontado com estudos histológicos e imagiológicos que levaram ao consenso que a tendinopatia de inserção não inflamatória no glúteo médio e/ou glúteo mínimo é a causa primária subjacente à dor lateral no quadril.

A distensão da bursa pode coexistir, mas é provável que seja secundária a outro acometimento.


Causas da tendinopatia glútea

Tendinopatia Glúteo

Cargas mecânicas são potentes condutores de processos biológicos dentro de tendões, os quais, por sua vez, determinam o aspecto estrutural e a capacidade de suporte de carga.

A qualquer momento, um tendão está sujeito a processos catabólicos e anabólicos; sob carga adequada, esses processos são balanceados e promovem a base para um estado de homeostase tecidual.

Porém, esse equilíbrio pode ser rompido pelo tipo, intensidade e frequência da carga aplicada.

Sintomas

Sintomas comuns
Dor na parte externa do quadril
A dor piora ao deitar sobre o lado afetado
Dor ao caminhar, principalmente em subidas, escadas ou ao sentar e levantar
Rigidez e amplitude de movimento reduzida da articulação do quadril
Suave ao toque
Dificuldade para dormir devido à dor
Dor ao ficar em pé ou andar por muito tempo
Dor ao cruzar a perna afetada sobre a outra perna enquanto está sentado



Fisiopatologia da tendinopatia glútea

SINDROME DO PIRIFORME DOR CIATICA

É razoável admitir que os processos fisiopatológicos subjacentes ao desenvolvimento da tendinopatia glútea são similares aos propostos para outras tendinopatias: podem decorrer de uma carga de tração relativamente aumentada (sobrecarga) ou diminuída (proteção de tensão) aplicada longitudinalmente ao longo do tendão, e/ou de uma carga transversal excessiva aplicada através do tendão (compressão, na inserção óssea ou próxima a ela).

A combinação de sobrecarga de tração e compressão é particularmente danosa.

Aumentos gradativos de tração, com tempos de recuperação e adaptação adequados, induzem um efeito anabólico e aumento subsequente da capacidade de resistência do tendão; já o rápido aumento da frequência e/ou intensidade da tração pode levar à falha da adaptação e gerar efeito catabólico.

Ao nível celular, ocorre a expressão de enzimas catabólicas que degradam as fibras de colágeno tipo I e aumentam a expressão de proteoglicanos pelos tenócitos, os quais separam as fibras de colágeno.

A degradação da matriz extracelular e as alterações no padrão funcional dos tenócitos reduzem a capacidade de resistência do tendão e o predispõem a lesões mesmo sob baixas cargas de tração.

Os tendões do glúteo médio e glúteo mínimo podem ser comprimidos pela banda iliotibial (ITB) no seu ponto de inserção no trocânter maior, de forma que a carga compressora é influenciada pela posição da junta do quadril.

O acúmulo de carga compressora no tendão pode resultar da adução excessiva do quadril durante posturas estáticas ou tarefas dinâmicas, como permanecer em pé com um quadril em adução; sentar-se com os joelhos juntos, ou cruzados, em adução e com inclinação pélvica lateral excessiva; ou durante o deslocamento durante atividades de carregamento unilateral.

Grandes amplitudes de flexão do quadril também podem alterar a tensão na banda iliotibial devido à substancial confluência fascial dessa estrutura com a fáscia glútea e na fáscia lombodorsal, contribuindo para a compressão dos tendões do glúteo médio e glúteo mínimo.

Além disso, a morfologia óssea também influencia nas forças compressoras transmitidas ao quadril pela banda iliotibial.

Nesse aspecto, a redução do ângulo fisiologicamente normal de 128º no pescoço femoral tende a aumentar a intensidade de forças compressoras.

Estudos mostram que, no ângulo normal, a banda iliotibial exerce força compressora de aproximadamente 656N no trocânter maior, mas, a 115ª, a força aumenta para 997N, o que está em acordo com o fato que pacientes com patologias mais graves no tendão glúteo têm menor ângulo entre a diáfise e o colo do fêmur em comparação a indivíduos normais.



Impacto da tendinopatia do glúteo

O impacto da tendinopatia é debilitante, pois tende a provocar distúrbios do sono – a dor intensifica-se a noite -, e a limitar a execução mesmo de atividades rotineiras.

Apesar de vários fatores de risco terem sido associados à tendinopatia glútea, poucos foram validados.

Sabe-se que a patologia afeta principalmente mulheres com idade superior a 40 anos, e a morfologia da pélvis feminina poderia estar associada a esse dado: existem evidências que, em mulheres, o glúteo médio tem um menor ponto de inserção no fêmur para dissipar cargas de tração, gerando menor eficiência mecânica que pode ser agravada em pessoas com um menor ângulo diáfise-colo do fêmur.

A tendinopatia glútea em pessoas com dor lombar também tem sido reportada, o que pode estar relacionada a uma possível disfunção no glúteo associada a dor nas costas ou na junção sacroilíaca, ou ao aumento no estresse através das costas como resultado de uma estabilidade precária lateral da pélvis.

Em casos sintomáticos mais avançados, é possível encontrar significativa atrofia gordurosa do glúteo médio e glúteo mínimo.

Dor miofascial – pode mimetizar a dor glútea

SINDROME DOLOROSA MIOFASCIAL GLUTEO

Pontos gatilhos miofasciais (contraturas musculares) podem também gerar rigidez, contratura, e dor na região do quadril.

Músculos acometidos incluem:

MúsculoPadrão de dor
Glúteo MáximoDor referida na nádega e na parte de trás da coxa, podendo chegar até o pé. Também pode ocorrer dor referida na região sacral, lombar e abdominal inferior.
PiriformeDor referida na região glútea, podendo se estender pela parte posterior da coxa até o tornozelo. Também pode ocorrer dor referida na região lombar e sacral.
Quadrado LombarDor referida na região glútea, podendo se estender pela parte posterior da coxa até o joelho. Também pode ocorrer dor referida na região lombar e abdominal inferior.

Além da tendinopatia glútea, a dor na região glútea também pode ser causada por pontos-gatilho miofasciais em músculos adjacentes, como o glúteo máximo, piriforme e quadrado lombar.

Esses músculos podem apresentar pontos-gatilho que referem dor para outras regiões do corpo. O glúteo máximo pode referir dor para a nádega e a parte de trás da coxa, podendo chegar até o pé.

O piriforme pode referir dor para a região glútea, podendo se estender pela parte posterior da coxa até o tornozelo.

Já o quadrado lombar pode referir dor para a região glútea e a parte posterior da coxa até o joelho.

É importante avaliar a presença desses pontos-gatilho miofasciais em pacientes com dor glútea para um diagnóstico mais preciso e um tratamento adequado.


Diagnóstico da tendinopatia do glúteo

COMO E RESSONANCIA MAGNETICA

O diagnóstico da tendinopatia glútea pode ser desafiador. O exame detalhado do quadril, da pélvis, e das costas deve ter como objetivo determinar se a causa primária de dor trocantérica está no trocânter maior ou distante dele.

O principal achado na tendinopatia glútea é dor associada à sensibilidade no trocânter maior, podendo haver irradiação ao redor do trocânter e para a parte inferior lateral da coxa.

O surgimento da dor é insidioso e tende a piorar ao longo do tempo, por vezes estando associado a mudanças na carga de treinamento ou atividade física, apesar de poder surgir de modo agudo após forte contração da musculatura adutora, como aquelas que ocorrem em quedas.


Diagnóstico clínico

Tendinopatia do gluteo medio e gluteo minimo

A avaliação da postura unilateral, na maioria dos casos, é designada mais como um teste de “provocação de dor” do que um método para avaliar a função muscular.

Existem versões do teste em que o paciente não é instruído a dobrar a pélvis em abdução relativa do quadril, posição de carga compressora relativamente menor no tendão; o deslocamento compensatório do tronco não é permitido, necessariamente resultando em uma posição de adução do quadril, mesmo em pessoas normais.

Assim, a posição de adução do quadril e a subsequente exposição dos tendões glúteos a uma carga compressora aumentada leva à reprodução de dor no trocânter maior, refletindo um teste positivo.

Dor à palpação (compressão direta) dos tecidos moles que recobrem o trocânter maior é considerada um dos sinais mais importantes para o diagnóstico da tendinopatia glútea, podendo estar acompanhada ou não de distensão da Bursa.

Os testes de Ober e de FABER (flexão/abdução/rotação externa) também podem ser aplicados.


Exames de imagem para tendinopatia do glúteo

Exames imagiológicos podem ser necessários para excluir lesões, ósseas ou em tecidos moles, que possam requerer intervenção cirúrgica, assim como para diagnóstico diferencial.

Ultrassonografia (US) e ressonância magnética (RM) são as técnicas mais utilizadas: há predomínio da ultrassonografia pelo seu menor custo e maior acessibilidade, mas a ressonância magnética é tida como padrão-ouro para avaliação dos tendões glúteos, pois permite tanto a avaliação de sinais diretos de tendinopatia glútea – como edema de tecidos moles e espessamento do tendão -, quanto de sinais indiretos – como a atrofia gordurosa do glúteo médio e glúteo mínimo.

Mas, para serem relevantes, os achados obtidos devem ter correlação clara com o quadro clínico do paciente.

ExameIndicaçõesAlterações observadas no exame
Radiografia simplesDescartar outras patologias do quadril e da coluna vertebral.Na tendinopatia do glúteo, os achados radiográficos podem estar ausentes ou apresentar pequenas alterações, como espessamento do tendão, calcificação ou osteófitos marginais. A radiografia simples também pode mostrar outras causas de dor no quadril, como artrose, osteonecrose e fraturas.
UltrassonografiaAvaliar o tendão e descartar outras causas de dor no quadril.A ultrassonografia pode mostrar espessamento, irregularidade e hipoecogenicidade (diminuição da ecogenicidade) do tendão. Além disso, pode identificar líquido inflamatório no espaço subglúteo. Este exame pode ser realizado dinamicamente, avaliando a tendinopatia durante a realização de atividades específicas.
Ressonância magnéticaAvaliar a extensão da lesão, o envolvimento de outras estruturas, e descartar outras causas de dor no quadril.Na tendinopatia do glúteo, a ressonância magnética pode mostrar espessamento e alterações de sinal no tendão glúteo médio ou mínimo. Também pode mostrar líquido inflamatório no espaço subglúteo, edema ósseo adjacente e bursite trocantérica. A ressonância magnética pode ser realizada com contraste para avaliar a extensão da lesão.
Cintilografia ósseaAvaliar outras patologias do osso, incluindo tumores ósseos.Pode ser normal ou mostrar áreas de aumento da captação de radiofármacos em locais de dor, indicando processos inflamatórios ou lesões ósseas.


Tratamento para tendinopatia

Quanto ao tratamento, não há evidência de qual seria a melhor abordagem.

Propõe-se que protocolos não-cirúrgicos sejam especificamente orientados por exercícios e manejo de carga no tendão.

Um processo de recuperação através da aplicação de cargas de tração progressivas, em posição de adução mínima do quadril, tende a ser benéfico pois visam a redução da dor e o incremento da capacidade de suporte de carga do tendão.


Ondas de choque – possível tratamento

Terapia com ondas de choque tem sido proposta como alternativa terapêutica, pois as ondas produzidas penetram os tecidos moles e teriam efeitos analgésico e de reparo nos tendões.

Já injeções de corticosteroides produzem alívio substancial da dor naqueles com tendinopatia do glúteo médio; porém o seu modo de ação e segurança no tratamento da tendinopatia permanecem a ser elucidados, especialmente por tratar-se do uso de substâncias anti-inflamatórias em uma patologia para a qual ainda não existe evidência de inflamação.


Cirurgia para tendinopatia do glúteo – em raros casos

Nos casos de falha das terapias mais conservadoras, a opção cirúrgica pode ser considerada. A literatura especializada divide-se em cirurgia para reparo de rupturas nos tendões, e soluções cirúrgicas para outras dores laterais refratárias no quadril.

Alguns estudos sugerem que em pacientes não responsivos a tratamentos conservadores existe considerável fraqueza no músculo abdutor e presença de rupturas nos tendões, e tais casos se beneficiariam da cirurgia; mas, na ausência de grupos controle, a qualidade dos dados torna-se questionável.

Assim, a ausência de concordância em qual teste seria o mais adequado para diagnóstico preciso da tendinopatia glútea significa que a avaliação clínica deve envolver uma bateria de testes.

Quanto ao tratamento, o objetivo primário é o alívio da dor.

Na falta de dados claros sobre a eficácia das alternativas disponíveis é necessário que sejam desenvolvidos estudos de eficácia e segurança a curto e a longo prazo, o que pode ser auxiliado através do igualmente necessário esclarecimento dos mecanismos subjacentes à tendinopatia glútea.


Referências:

Grimaldi A, Mellor R, Hodges P, Bennell K, Wajswelner H, Vicenzino B. 2015. Gluteal Tendinopathy: A Review of Mechanisms, Assessment and Management. Sports Med. 45(8):1107-19. doi: 10.1007/s40279-015-0336-5.

Grimaldi A, Fearon A. 2015. Gluteal Tendinopathy: Integrating Pathomechanics and Clinical Features in Its Management. J Orthop Sports Phys Ther. 45(11):910-22. doi: 10.2519/jospt.2015.5829.

Ladurner A, Fitzpatrick J, O’Donnell JM. 2021. Treatment of Gluteal Tendinopathy: A Systematic Review and Stage-Adjusted Treatment Recommendation. Orthop J Sports Med. 29;9(7):23259671211016850. doi: 10.1177/23259671211016850

Dr. Marcus Yu Bin Pai

CRM 158074 / RQE 65523, 65524 | Médico especialista em Acupuntura e Fisiatria pela USP. Área de Atuação em Dor pela Associação Médica Brasileira. Doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo. Professor e Colaborador do Grupo de Dor do Hospital das Clínicas da USP. Diretor do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA).

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CRM 158074 / RQE 65523, 65524 | Médico especialista em Acupuntura e Fisiatria pela USP. Área de Atuação em Dor pela Associação Médica Brasileira. Doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo. Professor e Colaborador do Grupo de Dor do Hospital das Clínicas da USP. Diretor do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA).

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