Padrão social: por que estamos insatisfeitos com nossos corpos? (parte 2)

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Distúrbios de Imagem e Pressão Social

Como visto anteriormente, a questão dos padrões sociais e estéticos atravessam nossa relação com o mundo e com nosso próprio corpo, o que por vezes pode acabar tornando-se um agravante, resultando em adoecimento psíquico.

Mesmo não havendo uma causa única e definitiva, os distúrbios e transtornos de imagem tem relação direta com as noções de norma e padrão social. Indivíduos afetados por problemas psicológicos de imagem tendem a perceber sua aparência de forma distorcida, muitas vezes concentrando-se em imperfeições ou falhas que podem nem ao menos ser evidentes ou importantes para os outros. A anorexia nervosa e a bulimia, por exemplo, são manifestações extremas da pressão social para atender aos padrões estéticos e de beleza. Sabe-se que a sociedade muitas vezes recompensa a magreza extrema com elogios e admiração, incentivando comportamentos prejudiciais em busca desse ideal inatingível.

Segundo o Instituto de Psicologia Aplicada (INPA):

“O Transtorno Dismórfico Corporal (TDC) é um transtorno psicológico em que a pessoa tem uma distorção da sua própria imagem. O paciente fica preocupado com pequenos detalhes e defeitos em seu corpo, causando uma forte uma angústia […].

O TDC está no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V) desde 1987. Dessa maneira, estima-se que o transtorno afeta de 1,7% a 2,4% da população, tornando-o um transtorno bem comum.

Não há uma causa específica para o Transtorno Dismórfico Corporal. No entanto, alguns pesquisadores acreditam que fatores genéticos e histórico familiar estejam relacionados com o desenvolvimento de TDC. O ambiente em que a pessoa está inserida pode afetar no aparecimento do transtorno. Ademais, pacientes com TOC, transtornos de ansiedade ou depressão têm mais chances de desenvolver o TDC.”

Considerando as informações do INPA, podemos perceber que há uma correlação entre a ansiedade e depressão com os transtornos de imagem. Dado que o entendimento de que a imagem corporal está inadequada à sociedade, não é só o corpo externo que sofre com isso, mas tudo aquilo que constitui nosso corpo interior também. Contudo, existem muitos casos de sofrimento psíquico que não chegam a somar ao índice de pessoas com transtorno, mas que também deve nos colocar em alerta.

Uma matéria de Taise Spolti, na coluna Viva Bem da Uol, demonstra como o uso das redes sociais pode acabar potencializando o sofrimento psíquico derivado do pensamento de inadequação do corpo:

“Um gatilho para o transtorno dismórfico corporal é a perfeição que a internet nos traz constantemente. Somos atacados segundo a segundo por perfeições, que incluem: corpos, rostos, vidas, carros, rotinas, famílias, roupas, estilo de vida e perfis motivacionais. Os últimos, por exemplo, constantemente tentam mostrar que sua vida pode melhorar a todo custo, que onde você está não é seu lugar e que você pode ficar melhor se seguir as dicas que eles têm para vender por poucas parcelas mensais (de dinheiro, mas também de vida, que se esvai).”

Taíse, ainda faz um alerta sobre os filtros de embelezamento usados em redes como o Instagram que propagam uma imagem irreal nas postagens cotidianas, reforçando a ideia de que o natural não é bem-vindo. O uso de filtros tornaram-se tão normais que quando o usuário posta uma imagem sem filtro é acompanhada da hashtag “sem filtro”, soando quase como um reforço de que é possível algo de belo existir sem o embelezamento artificial.

Falei em outro texto sobre como nossa vida parece ser balizada pelas redes sociais e nosso “eu virtual”. Vivemos em uma era na qual só existimos se postamos e quando postamos, porém o que é publicado deve ser sempre feito a partir de um crivo estético e de um falseamento da realidade. É como se, mesmo quando queremos parecer reais e compartilhar nossa vida por meio das redes, isso só é possível quando artificializamos o momento, seja por meio de filtros, poses, etc. Estamos diante de um problema complexo, visto que urge a necessidade de ser visto e de ser mostrado, mas não de uma forma real e natural. É preciso estar dentro dos padrões estéticos e instagramaveis, caso contrário o “like” não vem!!!

Dar-se conta dessa teia causal é urgente, pois consumimos o que postamos e assim estamos conjuntamente alimentando noções padronizantes e corpos idealizados.

A construção de identidades muitas vezes envolve a internalização de mensagens e normas sociais, o que pode levar a conflitos entre o eu autêntico e o eu moldado pelas expectativas externas. É importante entender que os distúrbios de imagem não são meramente problemas individuais, mas sim resultados de um sistema social que valoriza de forma distorcida a conformidade estética.

Ao questionar as normas sociais e estéticas que contribuem para os distúrbios de imagem, podemos criar uma base para a cura e a transformação. Isso envolve o reconhecimento de que a beleza e a identidade não podem ser definidas por padrões unidimensionais, mas sim devem ser exploradas e celebradas em sua diversidade.

Devemos criar caminhos alternativos às normas opressivas da sociedade. Isso implica explorar novas formas de identidade, expressão e relacionamento com o corpo e a imagem. Um exemplo inspirador de promover transformações a partir das redes sociais o movimento Body Positive, que celebra corpos de todas as formas, tamanhos e cores. Essa abordagem desafia as normas estéticas convencionais e promove a aceitação do corpo como ele é. Através do Body Positive, as pessoas podem reconstruir uma relação mais saudável e compassiva com seus próprios corpos, rompendo com padrões hegemônicos que potencializam o surgimento dos distúrbios de imagem.

Esse tipo de movimento é importante principalmente por nos aproximar e nos lembrar que o padrão é baseado e alimentado pelo sistema capitalista, que através da propagação de corpos idealizados vende a imagem de vidas perfeitas. Desse modo, promover a aceitação e a diversidade dos nossos corpos também é um moimento de luta social, que desafia as estruturas de poder buscando subverter as normas estabelecidas.

Mas para que esse movimento se torne ainda mais expressivo é necessário que continuemos a questionar tudo aquilo que se institui como norma e padrão. A aceitação da pluralidade de corpos depende da promoção da educação e da consciência crítica em relação aos padrões sociais e estéticos. Ao entender como essas normas são construídas e mantidas, podemos resistir à sua influência e trabalhar para desafiá-las. A educação sobre a manipulação das imagens na mídia, por exemplo, pode capacitar as pessoas a questionar as representações idealizadas que frequentemente causam insatisfação e distúrbios de imagem.

Ao desafiar a conformidade e questionar as normas, podemos trabalhar para criar uma cultura mais inclusiva, diversificada e compassiva. Através dessa análise crítica, somos convidados a reconhecer a complexidade das relações entre corpo, identidade e sociedade, e a cultivar um espaço de transformação e autenticidade.

Eduarda Moro

CRP 06/182921
Psicóloga, Mestra em Educação e Doutoranda em Ciências Humanas. Interessa-se por temas relacionados as humanidades, problemas da contemporaneidade e tudo aquilo que faz a vida mais viva e criativa. Pesquisadora na área de subjetividade e modos de subjetivação.

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Psicóloga, Mestra em Educação e Doutoranda em Ciências Humanas. Interessa-se por temas relacionados as humanidades, problemas da contemporaneidade e tudo aquilo que faz a vida mais viva e criativa. Pesquisadora na área de subjetividade e modos de subjetivação.

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