O que é imunização? Conheça os diferentes tipos

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A imunização é um tema que apresentou grande destaque nos últimos anos. Discussões sobre as vacinas, que já vinham se formando a algumas décadas, acabaram se intensificando durante a pandemia do coronavírus. Questões como efetividade, segurança, imunização natural e de rebanho foram alguns dos principais temas[1]Larson HJ, Cooper LZ, Eskola J, Katz SL, Ratzan S. Addressing the vaccine confidence gap. The Lancet. 2011 Aug 6;378(9790):526-35..

A imunização, porém, é um tema muito complexo, que envolve diferentes fatores e apresenta múltiplos tipos. É um assunto estudado por pesquisadores do mundo todo, visando entender melhor nosso sistema imunológico e prevenir o contágio de doenças de diversos graus de gravidade. Por isso, descobrimos mais sobre o assunto a cada ano[2]Brisse M, Vrba SM, Kirk N, Liang Y, Ly H. Emerging concepts and technologies in vaccine development. Frontiers in immunology. 2020 Sep 30;11:2578..

A seguir, apresentamos as principais informações sobre o assunto:  o que é imunização e seus diversos tipos e características.


O que é imunização?

O termo “imunização”, quando utilizado na medicina, se refere ao desenvolvimento por parte do corpo de mecanismos para prevenir ou conter de forma efetiva a ação de agentes infecciosos. Isto é, se refere à resistência a desenvolver determinada doença.

A imunização é regulada pelo sistema imunológico. Esse sistema é composto por vários tipos de células especializadas. Algumas têm a função de identificar possíveis ameaças. Outras, de conter essas ameaças, combatendo diretamente os agentes invasores. E outras, são capazes de “se lembrar” das ameaças, armazenando a metodologia necessária para eliminá-las[3]Mascola JR, Fauci AS. Novel vaccine technologies for the 21st century. Nature Reviews Immunology. 2020 Feb;20(2):87-8..

O processo de imunização consiste justamente em “ensinar” o sistema imunológico a se defender de determinada ameaça. Isso pode ocorrer naturalmente após combater uma infecção, mas também pode ocorrer de outras formas.


Imunização natural

A imunização natural é o processo de desenvolvimento de imunização a uma determinada doença por entrar em contato com seus agentes infecciosos.

A forma mais comum de desenvolvimento da imunização natural é por desenvolver tal doença. Isto é, ser infectado pelos agentes infecciosos na quantidade necessária para desenvolver os sintomas que caracterizam a condição.

Em geral, após sobreviver a uma infecção o corpo apresenta alta capacidade de se defender de futuras infecções por parte do mesmo agente infeccioso. Em geral, a imunização adquirida por combate de agentes vivos, como no caso da imunização natural, tende a ser mais efetiva e duradoura. Porém, essa imunização está sujeita a diversos fatores.

A principal questão é a gravidade da doença. Para desenvolver uma imunização efetiva, é necessário que o paciente se recupere da infecção sem apresentar sequelas graves.

Em alguns casos, é possível que a doença prejudique intensamente o funcionamento do corpo, e que isso se mantenha em parte após a doença ser curada. Isso pode causar prejuízos ao sistema imunológico, comprometendo, portanto, a imunização.

A memória do sistema imunológico é também um tanto específica. A metodologia desenvolvida se aplica a agentes que apresentem determinadas características. Se essas características mudarem, o sistema pode não ser capaz de aproveitar o que aprendeu anteriormente.

Vírus e bactérias se multiplicam rapidamente e, por isso, também evoluem rapidamente, o que pode modificar suas características com o tempo. Isso pode resultar em uma diferente aparência externa, ou alguma mudança de funcionamento, sem prejudicar sua habilidade de causar doenças. Em alguns casos, pode também intensificar os sintomas.

Essas mudanças podem ser o suficiente para prejudicar a resposta imune, dependendo de sua intensidade e quais características foram modificadas. Portanto, a imunização natural nem sempre é capaz de se adequar completamente a essas mudanças. E isso se mostra mais presente em pessoas que já apresentam um sistema imune debilitado, como pessoas idosas ou imunocomprometidas.


Imunização por contato

Um tipo especial de imunização natural é a obtida por contato com agentes infecciosos similares, em baixa quantidade, ou com menor habilidade de infecção.

Isso se mostra mais presente em pessoas que têm contato direto com animais. Um mesmo tipo de doença pode ser causado por uma grande gama de espécies de bactérias e vírus, resultando em sintomas semelhantes, mas diferentes espécies de agente infecciosos apresentam diferentes capacidades de infectar diferentes espécies de animais.

Portanto, agentes capazes de proporcionar doenças em vacas, por exemplo, podem apresentar dificuldade de infectar seres humanos. Porém, ao entrarem na corrente sanguínea, são combatidos pelo sistema imunológico da mesma forma.

Por isso, caso, posteriormente, a pessoa seja infectada por um agente similar e com capacidade de adoecer um ser humano, o corpo pode, em certos casos, se defender com maior facilidade, devido à sua experiência prévia com um agente similar.

Esse tipo de imunização foi observado cientificamente pela primeira vez em 1789 com o vírus da varíola. Pessoas que adquiriam varíola bovina apresentavam maior resistência posteriormente à varíola humana, vírus altamente contagioso e letal. Essa observação foi o que originou a vacina da varíola, a primeira vacina a ser produzida.

Leia também: Aedes de laboratório – inseto transgênico é solto na Bahia


Imunização por vacina

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Uma vacina é um tipo específico de medicamento produzido para promover a imunização a determinada doença[4]Arnon R, Ben-Yedidia T. Old and new vaccine approaches. International immunopharmacology. 2003 Aug 1;3(8):1195-204..

Ela é normalmente composta por um princípio ativo, isto é, o conjunto de substâncias responsáveis por gerar a resposta imune, imersas em um meio apropriado para seu armazenamento e inserção no corpo.

Nesse meio, normalmente composto majoritariamente por água, encontram-se algumas substâncias que visam aumentar a efetividade da vacina, como estabilizadores (por exemplo, lactose ou sacarose), surfactantes (substâncias que facilitam a diluição das substâncias) e adjuvantes (que facilitam a resposta imunológica, como sais de alumínio).

O objetivo da vacinação é desenvolver a imunidade sem necessitar lidar com a doença em si. Dessa forma, diminui-se o risco do contágio ser letal ou resultar em sequelas graves. As vacinas passam por rigorosos testes de efetividade e segurança antes de serem aplicadas na população, justamente para que sua utilização não acabe sendo mais danosa que a própria doença.

As vacinas também apresentam riscos de desenvolverem efeitos colaterais, assim como qualquer outro medicamento. Esses riscos e a intensidade dos efeitos são documentados durante os testes, e a vacina somente é liberada para amplo uso caso suas vantagens sejam muito maiores que suas desvantagens.

O método de aplicação costuma ser o da injeção, mas existem também vacinas orais, como a da poliomielite. O método usado depende da forma como o agente infeccioso entra no organismo, e visa simular esse método de entrada.

As vacinas são usadas em forma injetável quando o agente entra pelas vias aéreas, isto é, pela respiração. Os pulmões são uma porta de entrada direta para a corrente sanguínea, portanto, a vacina precisa simular a entrada do vírus diretamente no sangue. Por isso, nesse caso utiliza-se a injeção.

Quando o agente entra através do sistema digestório, por exemplo, devido a água ou comida contaminada, a vacina deve ser administrada de forma oral para melhor simular esse processo.


Vacinas vivas atenuadas

As vacinas vivas atenuadas são as que apresentam uma versão levemente modificada do agente infeccioso como princípio ativo.

Em geral, consiste em um agente que teve sua capacidade infecciosa prejudicada em laboratório. O agente ainda consegue se reproduzir normalmente, mas sua capacidade de provocar a doença é muito menor. Dessa forma, o corpo reage como se fosse uma infecção normal, agindo para contê-la e aprendendo com isso, mas há muito menos riscos para o paciente.

Como o agente não está totalmente inativado, podem ocorrer alguns efeitos colaterais semelhantes ao da doença original, mas em menor intensidade. Por outro lado, como a capacidade reprodutiva é a mesma do agente original, a resposta imunológica é tão intensa como se a infecção fosse proporcionada pelo agente original. Por isso, a imunização tende a ser tão duradoura quanto a imunização natural.

Dentre as vacinas vivas atenuadas usadas no Brasil, encontram-se a do sarampo, da caxumba e da poliomielite.


Vacinas inativadas

As vacinas inativadas são vacinas em que o agente infeccioso está inativado. Isto é, não possui capacidade infecciosa nem reprodutiva. Para isso, podem ser tratados em laboratório para eliminar suas funções ou adicioná-los de forma fragmentária ao corpo.

Ao entrarem no corpo, porém, são interpretados como um agente infeccioso comum, pois apresentam substâncias estranhas ao corpo. Mas, como não apresentam tanta ameaça ao corpo como o agente ativo, a resposta imune nem sempre é tão duradoura. Por isso, podem precisar de múltiplas doses.

Embora não sejam tão eficazes quanto as vacinas vivas atenuadas, elas apresentam algumas vantagens. Por exemplo, elas são mais fáceis de se armazenar, visto que as vacinas vivas precisam manter os agentes vivos para serem efetivas.

Elas também são as vacinas mais seguras. As vacinas vivas atenuadas apresentam uma chance bem pequena de os agentes acabarem recuperando sua capacidade de infecção. E para pessoas imunocomprometidas, essa atenuação muitas vezes não é suficiente, e pode resultar em complicações.

Dentre as vacinas inativadas usadas no Brasil, encontram-se a da hepatite A e B, da raiva e da gripe.


Vacinas de RNA mensageiro

A principal desvantagem das vacinas baseadas em introduzir agentes infecciosos, sejam eles atenuados ou inativados, é a dificuldade de produzi-las. É necessário obter grandes quantidades desses agentes e submetê-los a processos rigorosos para obter as vacinas em si.

Embora, após o desenvolvimento das primeiras vacinas para um determinado agente, torne-se relativamente mais fácil de produzi-las em larga escala, após uma mutação, é preciso iniciar o processo novamente. Isto é, conseguir uma boa quantidade de exemplares desses agentes para conseguir transformá-los em vacinas.

Em casos de infecções em larga escala por agentes altamente transmissíveis, a velocidade de mutação pode ser muito maior que a velocidade de desenvolvimento das vacinas, especialmente quando o agente é um vírus. E isso pode prejudicar a imunização da população.

Portanto, seria muito melhor utilizar algum método que resultasse nessa imunização e se adaptasse mais facilmente a essas mutações. E as vacinas de RNA mensageiro são uma forma de fazer isso.

Ao invés de conterem o agente infeccioso modificado, essas vacinas apresentam cópias de um RNA mensageiro obtido do agente. Esse RNA entra em contato com algumas células do corpo, produzindo uma das proteínas características desse agente. O corpo então detecta essa substância estranha e o sistema imunológico age para contê-la.

Dessa forma, quando o agente em si entrar no corpo, o corpo estará mais bem preparado.

Como a vacina não utiliza o agente em si, é muito mais fácil fabricá-la. Os métodos de sintetização de RNA são conhecidos há anos e são muito mais fáceis. Por isso, caso uma nova variante do agente seja detectada, também é mais fácil adaptar a vacina a ela: é necessário somente identificar mudanças na proteína e no seu RNA, e então iniciar a produção novamente.

Esse tipo de vacina já estava sendo estudado a muito tempo, e estrearam sua aplicação durante a pandemia da COVID-19, apresentando grande sucesso.

Imunização passiva

Outra forma de imunização consiste em transferir anticorpos de um ser vivo para outro, ao invés de estimular o sistema imunológico a produzir os próprios anticorpos. Essa é a imunização passiva.

Esse tipo de imunização é utilizado quando a pessoa apresenta dificuldade de criar os próprios anticorpos. Esse é o tipo de imunização obtido pelo bebê, por exemplo, através da placenta e da amamentação.

Ela costuma ser usada em casos em situações de alto risco. Por exemplo, para o tratamento da raiva, é utilizada em conjunto com a aplicação da vacina, de forma a desacelerar a progressão da doença e permitir que o corpo desenvolva imunidade através da vacina.

Seu principal uso, porém, é para o tratamento de toxinas. Alguns antídotos, usados para o tratamento de picadas de animais como cobras, aranhas e escorpiões, são o exemplo mais comum de imunização passiva.

Eles são o resultado da infusão de pequenas quantidades da toxina em animais mais resistentes, como cavalos, resultando na produção de anticorpos. Esses anticorpos são então extraídos, armazenados, e posteriormente transferidos para pessoas que tenham sido infectadas pela toxina.

Leia também: Pesquisa avalia cadeia genética envolvida na alergia ao amendoim

Imunização de rebanho

Imunização de rebanho é um conceito um pouco diferente. Não se trata da imunização da pessoa, mas sim das pessoas ao redor. O conceito se refere ao fenômeno de uma pessoa adquirir certa “imunidade” a um agente devido às pessoas ao redor estarem plenamente imunes.

Embora pareça simples, é um conceito muito complexo na prática. Não se sabe exatamente a proporção de pessoas necessárias para atingir essa imunização. Além disso, ela depende das características do agente infeccioso: se ele conseguir se proliferar enquanto é combatido pelo corpo, a capacidade da imunização de rebanho diminui muito.

Até mesmo doenças que já se pensavam erradicadas podem acabar retornando, de uma forma ou de outra, caso a imunidade individual esteja diminuindo. Esse é o caso da varíola do macaco, que se aproveita da diminuição da vacinação da varíola, e da poliomielite, que havia sido erradicada no Brasil, mas surtos no exterior podem fazê-la retornar.

Portanto, antes de tudo, é importante manter o próprio esquema vacinal em dia para garantir a própria imunização.

Referências Bibliográficas

Referências Bibliográficas
1 Larson HJ, Cooper LZ, Eskola J, Katz SL, Ratzan S. Addressing the vaccine confidence gap. The Lancet. 2011 Aug 6;378(9790):526-35.
2 Brisse M, Vrba SM, Kirk N, Liang Y, Ly H. Emerging concepts and technologies in vaccine development. Frontiers in immunology. 2020 Sep 30;11:2578.
3 Mascola JR, Fauci AS. Novel vaccine technologies for the 21st century. Nature Reviews Immunology. 2020 Feb;20(2):87-8.
4 Arnon R, Ben-Yedidia T. Old and new vaccine approaches. International immunopharmacology. 2003 Aug 1;3(8):1195-204.

Dra. Celia Yunes Portiolli

CRM-SP 27971 / RQE 5148 – 19469 Médica Pediatra e Especialista em Acupuntura Área de Atuação em Dor pela AMB (Associação Médica Brasileira), Coordenadora do Curso de Especialização em Acupuntura do CEIMEC – Centro de Estudo Integrado em Medicina Chinesa Médica colaboradora do Ambulatório de Acupuntura do Centro de Dor da Neurologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

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