A época logo após o nascimento de uma criança é uma das épocas mais felizes da vida das pessoas, ainda que seja também uma das que requeiram maior esforço e dedicação. É uma época em que se acompanha o desenvolvimento acelerado desse pequeno ser, suas façanhas e seu descobrimento do mundo.
Embora esse conjunto de acontecimentos traga bastante alegria aos pais, é importante também manter em mente as questões de saúde do recém-nascido. Nessa época, seu sistema imunológico ainda está pouco desenvolvido, e ele está sujeito a diversos tipos de infecções e alergias, que podem comprometer sua saúde e seu desenvolvimento.
Seguir o calendário de vacinação é uma das formas de fazer isso. A vacinação contribui para prevenir o contágio por um grande número de agentes infecciosos, a maioria deles capazes de produzirem doenças letais ou deixar sequelas permanentes.
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Porém, além da questão da infecção, existem também as condições de origem congênita, às quais deve-se estar atento também. No caso, são questões que podem estar presentes desde o nascimento, ou se desenvolver poucos meses depois, não sendo necessariamente causadas por agentes patológicos.
Um dos testes utilizados para identificar precocemente questões desse tipo é o Teste do Reflexo Vermelho (TRV), mais conhecido como teste do olhinho. O teste do olhinho é um teste rápido que visa identificar possíveis problemas de visão, alguns dos quais podem apresentar elevada gravidade.
Vamos entender como esse teste funciona.
Como funciona o teste do olhinho?
O teste do olhinho consiste em aplicar uma luz sobre o olho da criança. Para isso, comumente se utiliza um aparelho especializado, o oftalmoscópio. O objetivo é observar o reflexo do olho à luz nessa situação. O exame é realizado rapidamente com luz de intensidade apropriada, portanto, não causa danos à visão.
Em uma pessoa que não apresente deficiência visual ou alguma condição que afete o olho, o reflexo da luz nessas condições apresenta uma cor avermelhada ou alaranjada. Esse é um reflexo do fundo do olho, que torna-se visível dessa forma quando a pupila não apresenta tempo suficiente para contrair na presença da luz. É semelhante ao efeito comumente observado em fotografias com flash.
Em casos que o reflexo é esbranquiçado, apresenta pontos escuros, não ocorre, ou há considerável assimetria entre os dois olhos, isso é um indício de que pode haver algum tipo de problema no globo ocular. Neste caso, direciona-se a família para um oftalmologista para exames mais detalhados, de forma a diagnosticar o possível problema com maior precisão.
O teste do olhinho não é uma ferramenta diagnóstica em si, visto que há múltiplos tipos de fatores que modificam o reflexo do olho da forma descrita. Ele é, porém, um sinal de alerta precoce, que contribui para um diagnóstico mais rápido e para o direcionamento do tratamento.
A realização do teste do olhinho é atualmente obrigatória para recém-nascidos, sendo comumente realizada já na maternidade. Caso não tenha sido possível realizá-lo na maternidade, deve ser feito na primeira consulta com o pediatra.
Recomenda-se também que o teste seja realizado regularmente até que a criança complete dois anos de vida. Dessa forma, é possível identificar problemas congênitos que tenham iniciado tardiamente. Pode ser realizado esporadicamente também até os sete anos de idade, a critério do pediatra.
Próximos passos
Caso o teste tenha resultado em reflexos avermelhados e simétricos, isso significa que está tudo certo e não são necessários outros passos nesse sentido. É apenas necessário continuar a consultar um pediatra regularmente, para acompanhar o desenvolvimento da criança e sua saúde, e continuar a realizar o teste do olhinho durante os próximos anos.
Caso o resultado tenha identificado algum possível problema, é necessário consultar um oftalmologista. O teste do olhinho não é capaz de diagnosticar com precisão qual o problema de visão envolvido. Por isso, é necessário essa consulta adicional para a realização de uma sequência de exames mais precisa.
Muitos dos exames podem ser feitos já no consultório, com os equipamentos disponíveis para uso por parte do profissional. Porém, podem ser necessários outros tipos de exames também, para o diagnóstico diferencial.
Dentre as condições que podem ser identificadas partindo do teste do olhinho, encontram-se:
- Catarata congênita
- Hemorragias
- Retinoblastoma
- Miopia e hipermetropia
- Glaucoma
- Cegueira
- Entre outras
Condições identificáveis
As condições identificáveis variam em grau de intensidade e possibilidade de prejuízo à visão. A miopia e hipermetropia podem, em muitos casos, ser compensadas pelo uso de óculos e se resolverem espontaneamente com o tempo. O retinoblastoma, por outro lado, é um tipo de câncer, mas o diagnóstico precoce aumenta consideravelmente as chances de sobrevivência.
Porém, é importante saber também que a ocorrência de um resultado alterado por parte do teste do olhinho não implica necessariamente na presença de uma condição maligna no globo ocular. Em alguns casos, a diferença de coloração pode ser resultado de uma diferença de coloração do fundo do olho de origem congênita, ou de uma condição benigna conhecida como membrana pupilar persistente.
Em todo caso, a consulta ao oftalmologista é necessária para descobrir a natureza da diferença de coloração por parte do olho no teste do olhinho.
Catarata congênita
A catarata congênita consiste no desenvolvimento de catarata durante os primeiros meses de vida. Isso pode ser resultante tanto de questões genéticas, quanto pela contração de alguma doença durante a gestação (como a rubéola) ou de distúrbios do metabolismo.
A catarata consiste na turvação do cristalino, a lente do olho. Essa turvação compromete a transparência do cristalino, portanto, causa dificuldade de visão. A catarata, congênita ou não, começa de forma lenta e se intensifica gradualmente, até causar cegueira completa. Pode afetar ambos os olhos ou apenas um deles, a depender do caso.
O tratamento consiste em cirurgia de substituição do cristalino. O cristalino afetado é removido cirurgicamente e substituído por um cristalino sintético, normalmente composto por plástico ou silicone.
A cirurgia é normalmente realizada apenas a partir dos dois anos de idade, visando evitar possíveis complicações decorrentes da idade da criança e do sistema imunológico ainda imaturo. Até essa idade, utilizam-se lentes de contato para facilitar a visão e, com isso, também impedir que ela se atrofie.
Hemorragias
Hemorragias no olho são o resultado do sangue que circula nas paredes do olho penetrar as paredes e se encontrar presente no vítreo, líquido transparente que preenche o interior do olho. A presença desse líquido viscoso pode dificultar a visão, visto que apresenta opacidade consideravelmente maior que a do vítreo.
Essas hemorragias podem apresentar diversas causas, como traumatismos cranianos, infecções virais, aumento da pressão intraocular, menor pressão atmosférica (por exemplo, por estar em locais de grande altitude), entre outros.
Embora a presença de sangue dentro do olho aparente ser algo sério, geralmente é uma condição benigna e passageira. O olho tende a se cicatrizar e regenerar naturalmente, e o sangue é absorvido pelo corpo com o tempo.
O acompanhamento com o oftalmologista, porém, continua sendo necessário. Caso o sangue se mantenha no vítreo por muito tempo, especialmente em grandes quantidades, pode resultar na atrofia do olho. Neste caso, seriam necessárias outras abordagens.
Em alguns casos, porém, a ocorrência de hemorragia repentina e em grandes quantidades pode ser sinal de descolamento da retina, condição grave que apresenta alto potencial de resultar em cegueira, necessitando tratamento imediato.
O descolamento da retina tende a ser mais comum em pessoas mais velhas, mas pode também ser efeito colateral do retinoblastoma e de algumas inflamações oculares.
Retinoblastoma
O retinoblastoma é um tipo de câncer específico da infância, sendo mais comum em recém-nascidos. É raro, atingindo entre 1 em 15.000 e 1 em 30.000 crianças. Se desenvolve apenas na retina ainda imatura, por isso, não atinge adultos. Em alguns casos, pode ser hereditário.
Consiste em um tumor maligno que se desenvolve na retina, e de lá pode se espalhar para o resto do corpo, além de comprometer a visão no olho em que estiver presente. Em alguns casos, pode estar presente nos dois olhos, especialmente quando apresenta origem genética.
No teste de olhinho, a presença de reflexo esbranquiçado é um fator que pode indicar sua presença. Além disso, a presença do retinoblastoma também pode resultar em outras condições oftalmológicas, como estrabismo, inflamação ocular e dificuldades de visão.
Quando descoberto em seus estágios iniciais, isto é, antes de espalhar para fora do olho, o retinoblastoma apresenta mais de 90% de chance de sobrevivência. Caso já tenha atingido metástase, porém, as chances são muito menores.
O objetivo do tratamento é maximizar as chances do retinoblastoma não se desenvolver e não se espalhar. Por isso, quando ocorre em apenas um olho, o tratamento recomendado é o de enucleação, isto é, remoção completa do globo ocular.
Caso o retinoblastoma esteja presente em ambos os olhos, busca-se preservar a visão pela realização de tratamentos como fotocoagulação, quimioterapia intra-arterial ou crioterapia. Em alguns casos, um dos olhos pode ser retirado.
Quimioterapia sistêmica pode também ser aplicada, independente do caso, visando tratar possíveis ramificações da condição.
A presença do retinoblastoma também indica maior propensão para o desenvolvimento de outros tipos de câncer ao longo da vida. Por isso, recomenda-se manter acompanhamento médico geral como forma de identificar esses tumores precocemente também.
Miopia e hipermetropia
O teste do olhinho é capaz de identificar casos severos de miopia e hipermetropia, embora não seja necessariamente tão útil para identificar os casos mais leves.
Miopia consiste na dificuldade de enxergar e identificar objetos e figuras posicionados a longas distâncias. Tende a dificultar a leitura da lousa na escola, a prática de esportes e também a identificação de pessoas a longas distâncias. Consiste na presença de um globo ocular mais alongado, ao invés de ser esférico.
A hipermetropia, por outro lado, é a dificuldade de enxergar objetos e figuras próximos. Tende a dificultar a leitura e a escrita, o uso de dispositivos eletrônicos e a identificação de rostos. É reflexo de um globo ocular mais curto que o ideal.
A curto prazo, ambas condições geralmente conseguem ser compensadas pelo uso de óculos ou lentes de contato, a depender do grau. Elas tendem a evoluir com o tempo, o que geralmente leva a uma melhoria da visão.
O uso das lentes e óculos não influencia na evolução dos sintomas, sendo utilizados apenas para prover maior qualidade de vida. Sem isso, é possível, além das dificuldades de visão, desenvolver problemas como dores crônicas de cabeça, devido ao maior esforço necessário para identificar as formas vistas.
Glaucoma
O glaucoma é uma condição resultante do aumento da pressão intraocular, resultado de uma dificuldade de drenagem do vítreo. O aumento da pressão afeta principalmente o nervo ótico, nervo responsável por transmitir as informações da retina ao cérebro. O nervo ótico acaba sendo danificado por esse aumento da pressão, causando problemas de visão e até cegueira.
O glaucoma é mais comum em pessoas idosas, diabéticas, ou que sofreram algum tipo de traumatismo ocular. Porém, em casos raros, pode estar presente em crianças também, caso em que é conhecido como glaucoma infantil ou glaucoma congênito.
O glaucoma não tem cura, sendo uma condição crônica. Tem, porém, tratamento, que contribui para manter a saúde da visão e evitar graves danos ao nervo ótico. O tratamento normalmente consiste de uma intervenção cirúrgica inicial, seguida pelo uso de colírios, visando regular a pressão interna do olho.
Cegueira
Caso a criança já nasça com total ou quase total ausência da capacidade visual, em um ou ambos os olhos, comumente não há tratamento capaz de reverter isso. Isso pode ser resultado tanto de condições de origem genética quanto de doenças adquiridas durante a gravidez.
No caso do desenvolvimento da cegueira em ambos os olhos, o objetivo das intervenções subsequentes consistem em maximizar a qualidade de vida da criança fornecendo-a os meios de se adaptar à ausência desse sentido.
Isso implica em obter educação especializada, como o aprendizado do Sistema Braille e do uso de ferramentas e tecnologias de acessibilidade, assim como o aprendizado de outros recursos capazes de proporcionar autonomia durante e após seu desenvolvimento.
Esse tipo de educação especializada se alia à educação comum, conforme a Lei Brasileira de Inclusão, e é voltada também a crianças que apresentem cegueira adquirida, decorrente, por exemplo, de complicações resultantes de alguma das outras condições descritas anteriormente.
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