Aumento da Resistência Bacteriana Pós-COVID-19
Há mais de dez anos a resistência bacteriana vem sendo estudada, devido ao aumento do uso indiscriminado de antibióticos, que se tornou ainda maior durante a pandemia devido ao COVID-19.
Médicos e pesquisadores do mundo todo, atentos ao problema, afirmam que o uso desenfreado de antibióticos no tratamento da COVID-19 tornou e torna o cenário atual ainda pior, em que já existe a falta de antibióticos capazes de combater certos microrganismos causadores de doenças bacterianas[1]Fair RJ, Tor Y. Antibiotics and bacterial resistance in the 21st century. Perspectives in medicinal chemistry. 2014 Jan;6:PMC-S14459..
Lembrando que os antibióticos são medicamentos receitados contra infecções bacteriana e apenas bacterianas. Não é eficaz no combate a infecções virulentas, fúngicas ou contra parasitas.
O uso de antibióticos em todo o mundo cresceu 65% em 15 anos, a cada três prescrições médicas uma é desnecessária.
Os grandes causadores deste problema, são o uso indiscriminado por instituições de saúde, pela população e em práticas agropecuárias, que tem contribuído para o aumento da resistência aos antibióticos[2]Livermore DM. Bacterial resistance: origins, epidemiology, and impact. Clinical infectious diseases. 2003 Jan 15;36(Supplement_1):S11-23..
A rotina hospitalar, por exemplo, conta com uma série de procedimentos invasivos que são portas de entrada para as bactérias.
Em consequência ao aumento das infecções hospitalares associadas a estes instrumentos, o uso de antibióticos é intensificado, o que promove a seleção de bactérias resistentes neste ambiente.
O Que O Uso Indiscriminado de Antibióticos Pode Causar?
Alguns estudos apontam, que mais de 50% das prescrições de antibióticos são inapropriadas e, esse excesso do uso inadequado pode trazer consequência serias à saúde, além da resistência bacteriana[3]Jones RN, Pfaller MA. Bacterial resistance: a worldwide problem. Diagnostic microbiology and infectious disease. 1998 Jun 1;31(2):379-88..
As consequências do mau uso dos antibióticos são inúmeras: efeitos adversos relacionados aos medicamentos, sobretudo gastrointestinais, incluindo a diarreia, interação medicamentosa com outros medicamentos, principalmente na população idosa que utiliza vários medicamentos em simultâneo.
Vale ressaltar, que o paciente que utiliza um antibiótico de forma inadequada, em dosagens diferentes da prescrição, ou que interrompem o tratamento sem recomendação médica, está sujeito a riscos, uma vez que estas ações podem agravar a infecção e ocasionar o processo de seleção de bactérias resistentes, podendo tornar o uso do antibiótico ineficaz no caso de uma nova infecção.
Somado aos efeitos colaterais indesejados e ineficácia no uso incorreto, a resistência eleva os custos de tratamentos, prolonga a permanência dos pacientes nos hospitais e pode aumentar índices de mortalidade.
À medida que os antibióticos vão se tornando ineficazes, aumenta o número de infecções, que por sua vez se tornam mais difíceis de tratar, e consequente aumento[4]Current opinion in microbiology. 2000 Oct 1;3(5):496-501..
Com a diminuição das opções terapêuticas, infecções que hoje podem ser tratadas de forma simples, poderão, daqui alguns anos, causar danos maiores ao organismo, proporcional aos recursos que vão se reduzindo para combatê-las.
Cada caso deve ser bem analisado para determinar se a infecção é viral ou bacteriana, uma inflamação das amígdalas, uma mucosa avermelhada não são provas suficientes de que haja uma infecção bacteriana.
O uso indiscriminado se dá principalmente, nas infecções virais das vias respiratórias como o resfriado comum, a gripe, todas essas infecções são causadas por vírus, em que o antibiótico não trará nenhum efeito terapêutico sobre a doença.
Para evitar que as bactérias fiquem mais resistentes, existem hospitais adotando terapias com uso controlado de antibiótico, ou seja, receitando em casos de necessidade claramente comprovada e o mínimo possível, principalmente nos chamados antibióticos de amplo espectro que por sua vez, combatem uma maior variedade de bactérias.
Apesar disso, o antibiótico é importante e pode ser fundamental para salvar vidas, mas esse uso precisa ser feito de forma criteriosa e apropriada, e por isso o papel do médico e do farmacêutico são de extrema importância nesta conscientização.
Como As Bactérias Se Tornam Resistentes Aos Antibióticos?
A resistência a antibióticos ocorre quando determinada bactéria, que se multiplicam através da divisão celular apresenta uma mutação, ou seja, se modifica em resposta ao uso desses medicamentos. A mutação possibilita a bactéria uma vantagem de sobrevivência.
O antibiótico mata as bactérias normais, mas as bactérias que sofreram mutação podem se proteger contra o medicamento, consequentemente as bactérias mutantes e resistentes podem se multiplicar subitamente sem impedimento.
Portanto, são as bactérias que tornam resistentes e não os seres humanos.
Outro quadro alarmante que favorece este aumento de resistência, é a falta de sistemas de saneamento eficazes, que permite o lançamento de esgoto de hospitais e domicílios, sem o tratamento adequado, no meio ambiente.
Na natureza, estas bactérias entram em contato com outros micro-organismos e antibióticos, fomentando um novo processo de seleção que potencializa a resistência.
Águas poluídas ou alimentos contaminados podem colocar os indivíduos em contato com a bactéria que retorna ao hospital criando um ciclo.
Já as práticas da agricultura e da pecuária também contam com o uso dessas substâncias em grandes quantidades.
Como A Ciência Tem Feito Para Descobrir Novos Antibióticos?
A indústria farmacêutica nos últimos anos, tem investido muito menos em pesquisa e desenvolvimento para novos antibióticos quando comparado com alguns anos atrás.
No entanto, a limitação dos medicamentos disponíveis para o tratamento de infecções bacterianas, faz com que a indústria farmacêutica amplie seus estudos para o desenvolvimento de novos drogas.
Substâncias antimicrobianas potentes, também existem no meio ambiente, em qualquer lugar colônias bacterianas estão tentando sobreviver, por exemplo em um jardim, existem inúmeras bactérias e fungos, é uma grande batalha por nutrientes, os microrganismos produzem substâncias químicas que são usadas para eliminar os concorrentes
É baseado nesta luta por sobrevivência na natureza, que cientistas buscam estes microrganismos produtores destas substâncias químicas, para cultivá-los em laboratório e extrair deles o “antibiótico” que produzem por meio destas substâncias.
Posteriormente, bactérias causadoras de doenças são aplicadas em uma placa de petri, em seguida, amostras dos antimicrobianos do solo são adicionadas a cultura, normalmente bactérias crescem na placa, exceto quando encontram um agente antimicrobiano ao qual são suscetíveis, em uma área chamada de halo de inibição, se isso ocorre, significa que existe um antibiótico capaz de matar esse patógeno, e talvez a base para um novo medicamento.
Contudo, os estudos não se restringem apenas a estas cepas, pois por mais que sejam desenvolvidos novos medicamentos, as bactérias continuam desenvolvendo mecanismos para se tornarem resistentes. Para pensar em novas formas de combate, é preciso estudas a estrutura da bactéria, conhecer seus mecanismos de resistência e investigar novos alvos.
Referências Bibliográficas
↑1 | Fair RJ, Tor Y. Antibiotics and bacterial resistance in the 21st century. Perspectives in medicinal chemistry. 2014 Jan;6:PMC-S14459. |
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↑2 | Livermore DM. Bacterial resistance: origins, epidemiology, and impact. Clinical infectious diseases. 2003 Jan 15;36(Supplement_1):S11-23. |
↑3 | Jones RN, Pfaller MA. Bacterial resistance: a worldwide problem. Diagnostic microbiology and infectious disease. 1998 Jun 1;31(2):379-88. |
↑4 | Current opinion in microbiology. 2000 Oct 1;3(5):496-501. |