Frouxidão ligamentar pode causar dor crônica?

hipermobilidade articular

A frouxidão ligamentar é uma condição clínica hereditária conhecida como “Síndrome de hipermobilidade.” Esta condição é definida pelo aumento da elasticidade articular em movimentos passivos e hipermobilidade em movimentos ativos, associada à produção de colágeno[1]Ross J, Grahame R. Joint hypermobility syndrome. Bmj. 2011 Jan 20;342..

A hipermobilidade é a capacidade das articulações ultrapassarem amplitudes de movimento além das amplitudes consideradas fisiológicas.[2]Fikree A, Aziz Q, Grahame R. Joint hypermobility syndrome. Rheumatic Disease Clinics. 2013 May 1;39(2):419-30.

A hipermobilidade varia em um espectro de diferentes gravidades, algumas com complicações mais graves, incluindo a síndrome de Ehlers Danlos e a síndrome de Marfans.

A outra extremidade do espectro tem consequências mais leves que não ameaçam a vida, como a síndrome de hipermobilidade articular benigna. O termo síndrome articular de hipermobilidade benigna é uma fonte comum de queixas articulares ou musculares que causam muitas vezes preocupação para pais, crianças e professores.

A frouxidão ligamentar reduz com a idade, sendo mais comum em mulheres. Esta condição é muito comum nos pacientes com dor crônica,  evidenciando-se como uma das principais causas de dor crônica[3]Simpson MM. Benign joint hypermobility syndrome: evaluation, diagnosis, and management. Journal of Osteopathic Medicine. 2006 Sep 1;106(9):531-6..

Cerca de 20% dos meus pacientes no consultório, com idade abaixo de 40 anos possuem este quadro.

Avaliacao Hipermobilidade

Algumas pessoas terão uma amplitude de movimento grande, bem maior do que a maioria, como em umas bailarinas ou contorcionistas.

Os sintomas de dor podem estar presentes desde a infância, as chamadas: dores do crescimento. Frequentemente, as dores são intensas, no final do dia, atingindo joelhos, pés e tornozelos. Nas crianças, observam-se pontos miofasciais nas panturrilhas.

A amplitude extra de movimento nas articulações está frequentemente relacionada a mutações em genes que codificam um ou mais tipos de proteínas do tecido conjuntivo, incluindo colágeno, elastina e fibrilina.

O tecido conjuntivo é o que forma os tendões e ligamentos que conectam os músculos aos ossos e mantêm as articulações unidas. Quando uma mutação afeta uma proteína do tecido conjuntivo, o tecido conjuntivo geralmente fica mais solto e esticado com facilidade, levando a uma maior amplitude de movimento e deslocamentos potencialmente frequentes e problemas de movimento[4]Grahame R. Joint hypermobility syndrome pain. Current pain and headache reports. 2009 Dec;13(6):427-33..

Na Síndrome de Ehlers Danlos, as alterações no colágeno causam hipermobilidade articular.


Existem alguns testes que o profissional irá determinar se ela é a causa da dor crônica.

Quais os fatores que colaboram para a hipermobilidade?

  • O tônus muscular;
  • A propriocepção (senso de movimentos conjuntos);
  • A forma das extremidades dos ossos;
  • A alteração da estrutura do colágeno


Quais são os sintomas da síndrome de hipermobilidade articular?

hipermobilidade articular

Como uma condição benigna, muitas pessoas com Síndrome de Ehlers-Danlos Hipermobilidade Tipo III não apresentam sintomas e não requerem tratamento[5]Mishra MB, Ryan P, Atkinson P, Taylor H, Bell J, Calver D, Fogelman L, Child A, Jackson G, Chambers JB, Grahame R. Extra-articular features of benign joint hypermobility syndrome. Rheumatology. 1996 … Continue reading.

Na verdade, alguns atletas, como bailarinos e ginastas, podem se beneficiar da flexibilidade extra!

No entanto, ainda existem casos em que a síndrome de hipermobilidade articular pode apresentar sintomas incômodos como:

  • Dor ou rigidez nas articulações
  • Articulações que se deslocam facilmente
  • Pele fina ou elástica
  • Sensação de estalido
  • Fadiga


O excesso de flexibilidade pode provocar dor?

A dor crônica tem um componente multifatorial. A alteração na produção do colágeno modifica a estrutura dos tecidos moles e estes acabam ficando mais susceptíveis a lesões, uso excessivo e alterações degenerativas[6]Kumar B, Lenert P. Joint hypermobility syndrome: recognizing a commonly overlooked cause of chronic pain. The American journal of medicine. 2017 Jun 1;130(6):640-7..

O paciente com hipermobilidade inicia a sentir dor muito mais precoce do que as pessoas em geral, sem ter o tratamento adequado. Os pacientes podem progredir até mesmo para um quadro de dores generalizadas por sensibilização central (Fibromialgia)

Estes pacientes também apresentam uma redução na propriocepção, o que eleva o fator de risco de lesões nas articulações susceptíveis. Alterações na captação, transmissão e interpretação do sinal doloroso nestes pacientes, pode provocar uma reação exarcebada aos estímulos sensoriais. 

A frouxidão ligamentar pode antecipar algias (dores) que começariam somente após 40 a 50 anos, pessoas com menos idade deve procurar um profissional quando apresentarem dores sem causa aparente e tenham a percepção de ter um excesso de flexibilidade!

Muitas vezes a síndrome de hipermobilidade articular (SHA) é uma causa importante e esquecida no paciente com dor crônica. Provavelmente, é a causa mais usual de dor generalizada na pratica reumatológica, mas de forma rara é diagnosticada[7]Grahame R, Hakim AJ. What is the joint hypermobility syndrome?. Hypermobility, fibromyalgia and chronic pain. 2010 Sep 15:19-33..

Não há cura para a hipermobilidade, mas tem prevenções bem eficazes, sendo elaborado um bom programa de fortalecimento muscular. Quem tem flexibilidade exagerada tem a probilidade de ter torções frequentes no tornozelo.

A reeducação postural, o fortalecimento muscular e todo o trabalho para que o hipermóvel tenha uma vida normal, sem lesões constantes, é gradativo executado por um fisioterapeuta especializado, com o objetivo de maiores instabilidades do paciente ( nem todas as articulações são hipermovéis).

Outras são próximas do normal e outras mais evidentes e sintomáticas.


Quais são outros efeitos possíveis da síndrome de hipermobilidade?

Para algumas crianças, a frouxidão excessiva nas articulações e tecidos moles não apresenta problemas, no entanto, em outros casos, pode levar a:

  • má postura/senta em W
  • fraqueza muscular e baixa resistência
  • dor e fadiga, por ex. ao escrever
  • desenvolvimento motor grosso prejudicado
  • articulações e músculos dolorosos, que podem ser agudos ou crônicos
  • dificuldades de movimento tanto motora grossa quanto motora fina
  • dificuldade com exercícios prolongados
  • uma natureza cautelosa (isso pode ser secundário a seus problemas de movimento)
  • articulações frouxas – músculos tensos (geralmente ao redor dos quadris e ombros)
  • pé chato
  • maior propensão a lesões


Qual é o prognóstico para a síndrome de hipermobilidade articular?

fisioterapia hipermobilidade

Geralmente, não há consequências a longo prazo da síndrome de hipermobilidade articular. No entanto, articulações hipermóveis podem levar à dor nas articulações. Com o tempo, a hipermobilidade articular pode levar a cartilagem degenerativa e artrite[8]Castori M, Colombi M. Generalized joint hypermobility, joint hypermobility syndrome and Ehlers‐Danlos syndrome, hypermobility type. InAmerican Journal of Medical Genetics Part C: Seminars in … Continue reading.

Certas articulações hipermóveis podem estar em risco de lesão, como ligamentos torcidos.


Como a fisioterapia pode ajudar na síndrome de hipermobilidade?

hipermobilidade aconselhamento

Algumas crianças com síndrome de hipermobilidade acabarão por superar os problemas associados à medida que os ligamentos de suporte se fortalecem com o tempo.

Outras crianças podem ter problemas persistentes.

Uma equipe de Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais especializados pode ajudar a reduzir os efeitos da síndrome de hipermobilidade:

  • Planejar um programa de exercícios para aumentar a força e a resistência muscular e, assim, apoiar as articulações em sessões de intervenção individuais
  • Executar exercícios específicos de braço e mão para aumentar a força e a resistência muscular para levar a uma melhor estabilidade articular
  • Ajudar na estabilidade e postura do core (abdômen)
  • Auxiliar e planejar exercícios de desenvolvimento motor
  • Educar, dar assistência para melhorar a qualidade e o desempenho das habilidades motoras finas, especialmente a caligrafia
  • Orientar conselhos sobre alongamentos para músculos tensos
  • Orientar sobre o uso de sapatos e/ou encaminhamento a um podólogo, se necessário
    imobilização
  • Fornecer conselhos sobre tipos de exercícios e esportes apropriados
  • Aconselhar sobre técnicas apropriadas de controle da dor, como o uso de calor ou gelo
  • Reduzir o risco de lesões e dores persistentes na idade adulta, mantendo a força muscular e a boa postura com verificações regulares da postura
  • Aconselhar redução de fatores que podem piorar os sintomas, como excesso de peso
    fornecimento de um programa em casa
  • Encaminhamento a um especialista médico se houver preocupação com a gravidade da hipermobilidade
  • Uso de equipamentos adaptativos, como alças de lápis e cabos de talheres embutidos, para auxiliar no posicionamento correto das articulações e reduzir a fadiga e a dor durante as atividades da vida diária



Conclusão

Manter um peso saudável é importante para reduzir a carga nas articulações e ligamentos. Exercícios de baixo impacto são recomendados em vez de alto impacto, pois há menos estresse nas articulações. Boas opções incluem ciclismo, natação, caminhada e pilates.

Exercícios para fortalecer os músculos podem ajudar a reduzir o risco de lesões nas articulações, melhorar a estabilidade e o equilíbrio. Os exercícios musculares do assoalho pélvico (Kegel) também são importantes para reduzir o risco de desenvolver incontinência.

A fisioterapia pode ajudar avaliando quais articulações são hipermóveis, oferecendo conselhos, tratando lesões específicas e desenvolvendo um programa de exercícios individualizado para aumentar a força ao redor das articulações. Outras modalidades, incluindo bandagem e órtese, também podem ser benéficas para entorses ou luxações recorrentes.

Referências Bibliográficas

Referências Bibliográficas
1 Ross J, Grahame R. Joint hypermobility syndrome. Bmj. 2011 Jan 20;342.
2 Fikree A, Aziz Q, Grahame R. Joint hypermobility syndrome. Rheumatic Disease Clinics. 2013 May 1;39(2):419-30.
3 Simpson MM. Benign joint hypermobility syndrome: evaluation, diagnosis, and management. Journal of Osteopathic Medicine. 2006 Sep 1;106(9):531-6.
4 Grahame R. Joint hypermobility syndrome pain. Current pain and headache reports. 2009 Dec;13(6):427-33.
5 Mishra MB, Ryan P, Atkinson P, Taylor H, Bell J, Calver D, Fogelman L, Child A, Jackson G, Chambers JB, Grahame R. Extra-articular features of benign joint hypermobility syndrome. Rheumatology. 1996 Sep 1;35(9):861-6.
6 Kumar B, Lenert P. Joint hypermobility syndrome: recognizing a commonly overlooked cause of chronic pain. The American journal of medicine. 2017 Jun 1;130(6):640-7.
7 Grahame R, Hakim AJ. What is the joint hypermobility syndrome?. Hypermobility, fibromyalgia and chronic pain. 2010 Sep 15:19-33.
8 Castori M, Colombi M. Generalized joint hypermobility, joint hypermobility syndrome and Ehlers‐Danlos syndrome, hypermobility type. InAmerican Journal of Medical Genetics Part C: Seminars in Medical Genetics 2015 Mar (Vol. 169, No. 1, pp. 1-5).

Diene Oliveira Cruz

CREFITO: 197124-F | Fisioterapeuta, com Especialização em Ortopedia e Traumatologia pela Santa Casa de São Paulo

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