Memantina – Bula Simplificada – Tratamento para Demência e Alzheimer moderada

O Cloridrato de Memantina é um medicamento crucial no tratamento da doença de Alzheimer moderada a grave.

A doença de Alzheimer é a causa mais comum de demência, representando cerca de 60-80% dos casos. Como não há nenhum agente modificador da doença disponível, o tratamento se concentra em controlar os sintomas cognitivos e comportamentais.

Os inibidores da colinesterase, como donepezila, rivastigmina e galantamina, são comumente prescritos. Eles funcionam aumentando os níveis de acetilcolina, um neurotransmissor importante para funções cognitivas que está diminuído na doença de Alzheimer. Estudos mostram que esses medicamentos podem melhorar moderadamente os sintomas cognitivos e funcionais em cerca de metade dos pacientes por 6-12 meses. Efeitos colaterais incluem náusea, vômito e diarréia.

Este artigo fornece uma visão abrangente do medicamento, incluindo indicações, contraindicações, dosagem, efeitos colaterais e interações medicamentosas.

Indicações do Cloridrato de Memantina

Tratamento de Alzheimer

O principal uso do Cloridrato de Memantina é no tratamento da doença de Alzheimer em estágios moderados a graves. Este medicamento demonstrou ser eficaz em retardar os sintomas da doença, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.

Memantina e Alzheimer

A memantina é usada na doença de Alzheimer moderada a grave para retardar a taxa de neurodegeneração. Acredita-se que ela funcione bloqueando os receptores NMDA e, portanto, prevenindo a excitotoxicidade.

Isso sugere que a excitotoxicidade é o ponto final na doença de Alzheimer, em que as placas amiloides e emaranhados neurofibrilares causam algum problema com o manuseio de glutamato. Isso leva a níveis de glutamato cronicamente elevados no fluido extracelular, o que faz com que as células se encham excessivamente de cálcio e morram por sobrecarga de cálcio dos neurônios. Essa é a maneira pela qual a memantina mata os neurônios.

Estrutura e funcionamento dos receptores NMDA

Os receptores NMDA são canais de íon ligados a ligantes. Eles são formados por quatro subunidades de proteínas diferentes chamadas de polipeptídeos. Existem sete tipos diferentes de subunidades dos receptores NMDA: GluN1, GluN2A, GluN2B, GluN2C, GluN2D, GluN3A e GluN3B.

Cada subunidade tem uma estrutura com domínios terminais amino, domínios de ligação ao ligante, domínios transmembrana (M1, M2, M3 e M4) e loop M3-M4. As subunidades GluN2 se ligam ao glutamato, enquanto GluN1 e GluN3 se ligam à glicina.

A maioria dos receptores NMDA é formada por duas subunidades GluN1 e duas subunidades GluN2. A ligação da glicina às subunidades GluN1 e do glutamato às subunidades GluN2 faz o receptor NMDA abrir. Além disso, é necessária a despolarização da membrana para remover o íon magnésio que bloqueia o poro do receptor.

A abertura do receptor NMDA permite a entrada de íons de cálcio, sódio e a saída de íons de potássio. Isso só ocorre após a ligação dos ligantes e despolarização da membrana.

Mecanismo de ação da memantina

A memantina atua como um bloqueador de canal aberto dos receptores NMDA. Ela se liga ao canal aberto, impedindo o fluxo de íons. Porém, a memantina se dissocia rapidamente quando o receptor NMDA volta ao estado fechado após a retirada do glutamato.

Isso permite a neurotransmissão fisiológica normal, pois a memantina sai do canal NMDA a cada potencial de ação. Por outro lado, na excitotoxicidade há níveis tonicamente elevados de glutamato extracelular que mantêm os receptores NMDA abertos por longos períodos. Nessa situação, a memantina permanece bloqueando o canal, impedindo o influxo excessivo de cálcio e protegendo os neurônios.

Portanto, a memantina é eficaz contra a excitotoxicidade na doença de Alzheimer, sem causar muitos efeitos colaterais. Isso reforça a hipótese de que a excitotoxicidade mediada pelo receptor NMDA está na raiz do processo neurodegenerativo nessa doença.

Contraindicações e Precauções

Hipersensibilidade e Gravidez

O Cloridrato de Memantina é contraindicado para pacientes com alergia à substância ou seus excipientes. Além disso, devido à falta de dados clínicos robustos, seu uso durante a gravidez e lactação é desaconselhado.

Uso durante Gravidez e Lactação

Categorias de Risco

Classificado na categoria de risco B, o Cloridrato de Memantina deve ser evitado durante a gravidez e lactação, a menos que seja estritamente necessário, devido à sua possível excreção no leite materno e potenciais efeitos no crescimento intrauterino.

Administração do Medicamento

Instruções de Uso

O medicamento deve ser tomado oralmente, com ou sem alimentos, e não deve ser mastigado. A administração deve ser iniciada e acompanhada por um médico experiente, e a dosagem ajustada conforme a tolerância do paciente.

Posologia

Titulação e Manutenção da Dose

A dose diária máxima recomendada é de 20 mg. A titulação da dose é feita gradualmente para minimizar os efeitos adversos, começando com 5 mg/dia e aumentando semanalmente até a dose de manutenção.

Grupos Especiais

Uso em Idosos, Crianças e Pacientes com Insuficiência Renal ou Hepática

O Cloridrato de Memantina é recomendado para pacientes acima de 65 anos, mas não para crianças e adolescentes abaixo de 18 anos. Em casos de comprometimento renal ou hepático, ajustes de dose podem ser necessários.

Efeitos Colaterais

Reações Adversas Comuns

Os efeitos colaterais mais comuns incluem tonturas, cefaleias, constipação, sonolência e hipertensão. Estas reações são geralmente leves a moderadas.

Os efeitos colaterais mais comuns incluem:

  • Tontura: Este é um efeito colateral comum da memantina. Se você se sentir tonto, é recomendado não dirigir ou operar máquinas até se sentir melhor.
  • Dores de cabeça: Alguns pacientes podem experimentar dores de cabeça enquanto tomam memantina. Sugere-se descansar e beber bastante líquido se você experienciar esse efeito colateral. Se as dores de cabeça persistirem por mais de uma semana ou forem severas, é recomendado consultar seu médico.
  • Constipação: Este é outro efeito colateral comum. Aumentar a ingestão de fibras e manter-se hidratado pode ajudar a aliviar esse sintoma.
  • Confusão: Alguns pacientes podem experienciar confusão enquanto tomam memantina.
  • Sonolência: Sentir-se sonolento ou com sono é um efeito colateral comum da memantina. Se você experienciar isso, evite atividades que exigem alerta mental até saber como o medicamento afeta você.
  • Falta de ar: Alguns pacientes podem experienciar falta de ar enquanto tomam memantina.

Efeitos adversos menos comuns

Efeitos colaterais menos comuns incluem inchaço ou edema no rosto, braços, mãos, pernas inferiores ou pés, visão embaçada, nervosismo e batimentos no ouvido.

Em casos raros, a memantina pode causar efeitos colaterais graves, como convulsões, dor aguda no peito, falta de ar repentina, dificuldade em respirar ou tossir sangue, que podem ser sinais de um coágulo sanguíneo no pulmão. Se você experienciar algum destes sintomas, procure atendimento médico imediato.

É importante notar que nem todos experimentarão esses efeitos colaterais, e eles podem diminuir com o tempo à medida que seu corpo se ajusta à medicação. Se algum desses efeitos colaterais persistir ou piorar, é recomendado consultar seu médico.

Em quanto tempo os efeitos adversos melhoram?

Para efeitos colaterais leves, como sonolência, tontura, dor de cabeça e confusão, eles podem desaparecer dentro de alguns dias ou algumas semanas. No entanto, é importante observar que, se esses efeitos forem incômodos ou não melhorarem, é recomendado consultar um profissional de saúde.

Em alguns casos, pode levar até 3 meses para a memantina funcionar completamente e, durante este período, o corpo pode se ajustar e os efeitos colaterais podem diminuir.

Superdose

Sintomas e Tratamento

Em casos de superdose, os pacientes podem apresentar sintomas que afetam o sistema nervoso central e gastrointestinal. O tratamento deve ser sintomático e de suporte.

Interações Medicamentosas

Interações Farmacodinâmicas e Farmacocinéticas

O Cloridrato de Memantina pode interagir com outros medicamentos, como L-dopa, anticolinérgicos, antiespasmódicos e anticoagulantes orais. É fundamental monitorar a co-administração com outros medicamentos para evitar efeitos adversos.

Evidências do uso da Memantina

A memantina é um medicamento que foi extensivamente estudado por sua eficácia no tratamento da doença de Alzheimer, particularmente em seus estágios moderados a graves. A evidência de sua eficácia é derivada de numerosos ensaios clínicos e metanálises.

Um ensaio clínico controlado por placebo de 12 semanas com memantina realizado em residentes de casas de repouso e pacientes de hospitais psiquiátricos mostrou uma resposta positiva em 73% dos pacientes tratados com memantina, comparado a 45% dos pacientes tratados com placebo. Essa resposta foi independente da etiologia da demência[1].

Uma metanálise de ensaios clínicos randomizados investigando a eficácia da memantina na doença de Alzheimer descobriu que a memantina teve um efeito benéfico na redução do agravamento dos sintomas clínicos em pacientes com doença de Alzheimer moderada a grave[2].

Outro ensaio clínico randomizado demonstrou a segurança e eficácia da monoterapia com memantina para pacientes com doença de Alzheimer moderada a grave. O estudo sugeriu que a memantina representa uma nova abordagem para o tratamento de pacientes com doença de Alzheimer moderada a grave[3].

Uma revisão sistemática e metanálise sugeriu que a monoterapia com memantina é benéfica para o tratamento da doença de Alzheimer, conforme avaliado por múltiplas escalas que avaliam cognição, distúrbios comportamentais, atividades da vida diária, função global e estágio da demência[6].

No entanto, é importante notar que, enquanto a memantina mostrou eficácia na doença de Alzheimer moderada a grave, sua eficácia na doença de Alzheimer leve é menos clara. Um estudo publicado na Rede JAMA concluiu que havia falta de evidência para a eficácia da memantina na doença de Alzheimer leve[10].

Em conclusão, a memantina mostrou ser eficaz no tratamento da doença de Alzheimer moderada a grave, com benefícios observados na função cognitiva, distúrbios comportamentais e atividades da vida diária. No entanto, mais pesquisas são necessárias para determinar sua eficácia na doença de Alzheimer leve.

Considerações Finais

Precauções e Cuidados

Pacientes com epilepsia ou histórico de convulsões devem ter cuidado extra. O uso concomitante com outros antagonistas NMDA deve ser evitado. Além disso, é essencial monitorar o pH urinário e a capacidade de dirigir ou operar máquinas durante o tratamento.

Conclusão

O Cloridrato de Memantina é um medicamento eficaz no tratamento da doença de Alzheimer, mas seu uso requer monitoramento cuidadoso e ajuste de dose em grupos especiais. Pacientes e cuidadores devem estar cientes das possíveis interações medicamentosas e efeitos colaterais para garantir o uso seguro e eficaz do medicamento.

Embora esses medicamentos não alterem o curso da doença subjacente, eles podem proporcionar benefícios sintomáticos importantes. O tratamento deve começar assim que o diagnóstico for confirmado, visando as doses máximas toleradas. Os benefícios parecem persistir com o uso contínuo.

Além da medicação, intervenções não farmacológicas são cruciais. O exercício físico, atividades cognitivas, socialização e educação dos cuidadores podem melhorar os sintomas e a qualidade de vida. Considerar a inscrição do paciente em ensaios clínicos também é importante para o acesso a novos tratamentos promissores.

Referências

[1] https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2654628/

[2] https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/17496417/

[3] https://jamanetwork.com/journals/jama/fullarticle/198033

[4] https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6425228/

[5] https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/nejmoa013128

[6] https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371%2Fjournal.pone.0123289

[7] https://www.cochrane.org/CD003154/DEMENTIA_memantine-treatment-dementia

[8] https://www.clinicaltrials.gov/ct2/show/NCT00322153

[9] https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/ibra.12098

[10] https://jamanetwork.com/journals/jamaneurology/fullarticle/1107815

[11] https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2762361/

[12] https://www.ahajournals.org/doi/10.1161/01.str.0000020094.08790.49

[13] https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2712175

[14] https://bmcgeriatr.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12877-018-0857-5

[15] https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fnins.2019.00472

[16] https://www.dementia.org.au/sites/default/files/helpsheets/Helpsheet-DementiaQandA03-Memantine_english.pdf

[17] https://alz-journals.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1016/j.jalz.2013.01.014

[18] https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/nejmoa1106668

Dr. Marcus Yu Bin Pai

CRM 158074 / RQE 65523, 65524 | Médico especialista em Acupuntura e Fisiatria pela USP. Área de Atuação em Dor pela Associação Médica Brasileira. Doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo. Professor e Colaborador do Grupo de Dor do Hospital das Clínicas da USP. Diretor do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA).

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Dr. Marcus Yu Bin Pai

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CRM 158074 / RQE 65523, 65524 | Médico especialista em Acupuntura e Fisiatria pela USP. Área de Atuação em Dor pela Associação Médica Brasileira. Doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo. Professor e Colaborador do Grupo de Dor do Hospital das Clínicas da USP. Diretor do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA).

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