Ansiedade: vivendo com medo do futuro

A ansiedade é uma emoção intrínseca à experiência humana, desempenhando um papel adaptativo ao nos alertar sobre potenciais ameaças e desafios. Por isso mesmo costumo reforçar a diferença daquilo que se constitui como ansiedade patológica, da ansiedade enquanto emoção/sentimento relativo ao modo de vida vivido na contemporaneidade.

Nesse texto focaremos no segundo caso: a ansiedade enquanto modo de vida. Um viver ansioso, que pensa no amanhã e no que vem depois com um sentimento carregado de angústia.

Nas últimas décadas, tem se observado um aumento significativo na prevalência da ansiedade como um sintoma da vida adulta. Esse fenômeno complexo reflete não apenas as mudanças individuais, mas também as transformações profundas que ocorrem em nossa sociedade. Daí a importância de compreender o quanto do nosso modo de vida está imbricado nessas dinâmicas ansiogênicas que só fazem por maximizar o sentimento de que a vida está escorrendo pelas mãos. É necessário analisar como fatores sociais e culturais interagem com as percepções individuais, que resultam em vidas que vivem angustiadas e preocupadas com um futuro que talvez não chegue – não ao menos do modo como se idealizou.

A cultura e a sociedade desempenham um papel fundamental na forma como as pessoas experimentam a vida. Em diferentes culturas, as expectativas e pressões sociais variam, o que significa que a ansiedade do futuro pode se manifestar de maneira diferente em contextos culturais distintos. Por exemplo, em algumas culturas a pressão para obter sucesso acadêmico e profissional pode ser especialmente intensa, o que pode levar a altos níveis de ansiedade em relação ao futuro entre os jovens. Por outro lado, em culturas mais individualistas, a pressão para se destacar e ser independente pode ser uma fonte significativa de ansiedade.

Além disso, a mídia desempenha um papel importante na formação das expectativas sociais. A representação de vidas ideais e de sucesso nas mídias sociais pode criar expectativas irrealistas e contribuir para que o sentimento de ansiedade seja experimentado por quase todo ser humano, no decorrer da vida.

Cenário de Incerteza

Vivemos em uma era marcada por avanços tecnológicos, mudanças econômicas imprevisíveis, ameaças ambientais e transformações culturais. Essa aceleração constante cria um cenário de incerteza, onde as perspectivas do futuro podem parecer cada vez mais nebulosas. A falta de previsibilidade pode levar a um aumento na ansiedade, já que os indivíduos se sentem despreparados para lidar com as demandas futuras. Nesse sentido a psicoterapia pode ajudar a explorar os sentimentos atrelados a essa incerteza, buscando analisar como o cenário atual afeta o modo como as pessoas percebem seu próprio futuro e o futuro da sociedade como um todo.

Comparação Social e Pressões Sociais

A natureza altamente conectada de nossa sociedade contemporânea também desempenha um papel importante na produção de sentimentos e pensamentos ansiogênicos. As redes sociais e os meios de comunicação constantemente nos bombardeiam com comparações sociais, onde as realizações dos outros são exibidas de forma proeminente. Isso pode levar a sentimentos de inadequação e pressões para atingir determinados padrões de sucesso. Você já parou para pensar em como a busca por validação social e a preocupação com a imagem afetam as percepções de futuro? O Instagram, TikTok, Twitter e redes sociais em geral são sinônimos da geração 30+, é difícil pensar em uma vida que não explora ou se conecta por meio do online. É clichê, mas importante reforçar a noção de que a vida postada nas redes sociais é balizada por filtros e outras tantas coisas que foram justamente pensadas para nos fazerem sentir que a grama do vizinho é mais verde. Assim o sentimento de ansiedade e angústia são ainda mais potencializados pela pressão e comparação que se faz quando acompanhamos a vida alheia nas redes.

Perda de Comunidade e Isolamento

Apesar da conectividade virtual, muitas pessoas relatam sentimentos de solidão e isolamento. A perda de comunidade e conexões significativas pode aumentar a ansiedade relacionada ao futuro, uma vez que os sistemas de apoio tradicionais estão se desintegrando, sendo cada vez mais comum relações que existem apenas no online. A precarização da vida social e de contato offline influencia diretamente a maneira como as pessoas enfrentam as incertezas da vida; podendo surgir daí uma tendência ao isolamento por ser cada vez mais difícil se conectar com o mundo lá fora.

Precarização do Trabalho

As mudanças na economia global também têm um impacto profundo no que diz respeito ao medo do futuro. A precarização do trabalho, a automação e as transformações nas estruturas de emprego podem levar a inseguranças financeiras e profissionais. Somos seres sociais que se constituem através das relações e da produção, ou seja, o trabalho é determinante na constituição da nossa identidade. Desse modo, essas mudanças afetam a identidade e a autoestima das pessoas, bem como suas percepções de controle sobre o futuro que parece frágil dada a falta de estabilidade no emprego e os novos modelos de contratação no ambiente corporativo.

Enfrentando a ansiedade e o medo do futuro

Sempre importante frisar a necessidade da construção de redes de apoio social. Ter amigos e familiares em quem confiar e com quem compartilhar preocupações pode ser uma maneira eficaz de reduzir a ansiedade. Precisamos lembrar que o medo do desconhecido, do novo, é algo que angustia a sociedade em geral. Assim, compartilhar os pensamentos e sentimentos relacionados ao medo do futuro é interessante no sentido de entender que: primeiro, não estamos sozinhos quando nos sentimos assim; segundo: se várias pessoas do meu círculo social se sentem assim também, isso significa que algo que é exterior e maior do que nós está causando essa ansiedade e que isso deriva de um problema socioeconômico global.

Além disso, a educação emocional é fundamental. Aprender a reconhecer e gerenciar emoções, incluindo a ansiedade, pode nos ajudar a lidar melhor com as incertezas do futuro. Isso pode incluir a prática de técnicas de relaxamento, meditação e é claro, a psicoterapia. Tentar entender os motivos que desencadeiam determinados sentimentos e pensamentos, escrevê-los no papel, analisá-los, são todos passos necessários para uma vida que busca se manter saudável. A compreensão do nosso funcionamento psíquico é essencial no desenvolvimento de estratégias eficazes de enfrentamento e intervenção, para que possamos viver mais no hoje e menos no amanhã.

Eduarda Moro

CRP 06/182921
Psicóloga, Mestra em Educação e Doutoranda em Ciências Humanas. Interessa-se por temas relacionados as humanidades, problemas da contemporaneidade e tudo aquilo que faz a vida mais viva e criativa. Pesquisadora na área de subjetividade e modos de subjetivação.

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Psicóloga, Mestra em Educação e Doutoranda em Ciências Humanas. Interessa-se por temas relacionados as humanidades, problemas da contemporaneidade e tudo aquilo que faz a vida mais viva e criativa. Pesquisadora na área de subjetividade e modos de subjetivação.

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